quarta-feira, maio 14, 2025
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Gigante devorado nas profundezas

O Titanic fascina a opinião pública e desperta interesse de pesquisadores mesmo decorridos 108 anos de seu naufrágio, que matou 1.514 passageiros e tripulantes. Um desastre evitável durante a viagem inaugural que mudou as normas da engenharia naval e da segurança marítima. Agora, a confirmação de que os destroços daquela que foi considerada a maior embarcação de seu tempo estão em franca deterioração e podem desaparecer a partir de 2033 provocam curiosidade, consternação e, claro, buscas na rede por documentários e pelo clássico açucarado das telas “Titanic”, de 1997, estrelado por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet. Mas o que vale de verdade é o aspecto científico.

A suspeita de que algo está destruindo com mais rapidez do que o esperado os restos do casco e da superestrutura metálica existia desde 2010. O culpado pelo desaparecimento inexorável do colosso de 53 mil toneladas de deslocamento que jaz a 3,8 mil metros de profundidade no leito do Atlântico Norte é microscópico e insidioso. A bactéria Halmonas titanicae (em homenagem ao navio) foi isolada e identificada por uma equipe coordenada pela pesquisadora Henrietta Mann, da Universidade Dalhousie, de Halifax, Canadá. Halifax, por sinal, é o porto mais próximo do local do naufrágio, distante 640 quilômetros, e para onde foram levados 209 corpos resgatados — outros 109 foram sepultados no mar. O museu marítimo da cidade preserva itens que vieram dar à costa, como espreguiçadeiras e painéis da sala de estar da primeira classe.

Ferro-velho marinho

Para Henrietta Mann, o navio só se manteve relativamente intacto por estar em um local sem luz, frio e submetido a alta pressão. Diante de um ambiente inabitável para quase todas as formas de vida, Mann acredita que as bactérias chegaram até ali vindas do alto, “caindo da superfície” como sujeira para grudarem no casco. O que é extraordinário na Halmonas titanicae é sua capacidade de viver em ambientes adversos, como pântanos altamente salinos, mas não se sabe se esse fator foi essencial no Titanic. “Ali há muita comida para minhas bactérias”, diz Mann, lembrando que a área é palco de uma disputa biológica que pende para sua descoberta. Em naufrágios mais próximos da superfície — da luz e do calor —, outras colônias de bactérias criam uma camada biológica que protege peças ferrosas da corrosão. É por isso que de vez em quando canhões de naus, galeões ou caravelas dos séculos XV ou XVI são encontrados quase intactos.

A deterioração do transatlântico será uma perda, mas também traz alento ambiental. O papel das bactérias comedoras de ferro indica que os destroços não ficarão no fundo do mar por centenas de anos, como num ferro-velho submarino. Em vez disso, o metal oxidado vai entrar em colapso, mas seguirá abrigando vida marinha. Só no Atlântico Norte há centenas de cargueiros e petroleiros afundados nas guerras mundiais, enquanto o Golfo do México está repleto de restos de plataformas de petróleo, como a Deepwater Horizon, que afundou em 2010, causando um desastre ecológico. Tudo isso pode ser absorvido por microrganismos, estimulando a vida marinha.

Pena que os cientistas ainda não encontraram um primo da Halmonas titanicae capaz de viver perto da superfície. No Oceano Pacífico, há centenas de destroços americanos e japoneses se desfazendo lentamente em atóis e ilhas quase esquecidas, como Tarawa, Saipan, Palau e Truk. Em alguns pontos, são atrações turísticas, em outros, grandes riscos à navegação e fontes de poluição.

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