BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) — Um dia depois de ter sido cobrado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por uma correção de rumo no combate à pandemia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) comentou a decisão do governo alemão de cancelar uma paralisação rígida do país durante a Semana Santa e disse que o recuo ocorreu porque os efeitos do confinamento seriam mais graves do que as consequências do vírus.
“A Angela Merkel [primeira-ministra da Alemanha], ia ter um lockdown rigoroso lá e ela cancelou, pediu desculpas. Ela falou lá, segundo a imprensa, que os efeitos do fechar tudo são muito mais graves do que os efeitos do vírus, palavras delas, não é minha não”, disse Bolsonaro, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.
A fala de Bolsonaro foi transmitida por um site simpático ao presidente.
O presidente se referiu ao anúncio feito por Merkel na quarta-feira (24).
A primeira-ministra da Alemanha recuou dos planos de promover um confinamento total durante o feriado de Páscoa, que ela havia anunciado um dia antes.
A líder alemã afirmou que a decisão de elevar as restrições fazia sentido, “porque é absolutamente necessário desacelerar e reverter a terceira onda da pandemia”, mas não houve planejamento prévio suficiente.
Com o número de novos casos em alta há quatro semanas consecutivas, o governo havia decretado que todas as lojas ficariam fechadas de 1º a 5 de abril, com exceção de mercados no sábado, dia 3, e as cerimônias religiosas presenciais, suspensas.
Mas as medidas foram questionadas por epidemiologistas, políticos e empresários, por motivos diferentes, levando Merkel a recuar. “A ideia teve bons motivos, mas não conseguiu concretizar-se bem no curto espaço de tempo disponível”, disse ela.
Apesar do recuou de Merkel, a Alemanha conta com outras políticas de distanciamento social ainda em vigor.
O país europeu apresenta números de infecções e de mortes inferiores aos do Brasil, hoje considerado o epicentro da Covid-19 no mundo, inclusive com a circulação de uma variante mais transmissível.
A Alemanha soma um total de 2,7 milhões de pessoas infectadas e mais de 75 mil mortes.
O Brasil, por outro lado, tem 12,2 milhões de infectados e ultrapassou a barreira de 300 mil óbitos.
Bolsonaro é contrário às ações de distanciamento social adotadas por governadores. O presidente frequentemente ataca os gestores locais por essas medidas que, segundo ele, afetam a economia do país.
A fala de Bolsonaro contra a política de lockdown — confinamento rígido de cidadãos para evitar a disseminação do vírus — ocorre um dia depois de uma reunião entre os chefes dos três poderes para tentar esboçar uma reação diante do momento mais crítico da pandemia no Brasil.
Nos últimos dias, o país tem contabilizado recordes diários no número de mortos pela doença, com os sistemas hospitalares nos estados à beira do colapso.
Na reunião no Palácio da Alvorada, com a presença dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e de um grupo de governadores, Bolsonaro anunciou a criação de um comitê para coordenar as ações de enfrentamento à pandemia.
O encontro foi pensado pelo Palácio do Planalto como uma forma de mostrar reação do governo na crise sanitária, uma vez que o aumento das mortes e a postura negacionista de Bolsonaro têm afetado a popularidade do presidente.
“A vida em primeiro lugar. Resolvemos entre outras coisas, que será criado uma coordenação junto aos governadores com o sr. presidente do Senado Federal”, disse o presidente na ocasião.
Mas no final da tarde de quarta Lira decidiu subir o tom contra o governo.
Ele afirmou que, se não houver correção de rumo, a crise pode resultar em “remédios políticos amargos” a serem usados pelo Congresso, alguns deles fatais.
É a primeira vez que Lira faz menção, mesmo que indireta e sem especificar, à ameaça de CPIs e de impeachment contra o presidente da República, em um momento em que Bolsonaro tenta atrair Legislativo e Judiciário para a coordenação da pandemia.
“Estou apertando hoje um sinal amarelo para quem quiser enxergar”, disse Lira, afirmando que o caos na saúde gerado pela crise de Covid-19 precisa ser um fator de conscientização das autoridades envolvidas no sentido de “que o momento é grave” e que “tudo tem limite”.
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