Ministério Público Federal quer impugnar o concurso da Polícia Federal, um dos mais cobiçados de 2018. Veja por que
São Paulo – O concurso público da Polícia Federal, um dos mais esperados do ano, pode ter seu edital alterado e as inscrições reabertas.
No fim da última semana, o Ministério Público Federal solicitou na Justiça a retificação do edital do concurso que tem 500 vagas. Caso as mudanças não sejam feitas, o MPF pede ao Judiciário que determine a suspensão do concurso.
Com salários 11.983,26 reais para agente, escrivão e papiloscopista e de 22.672,48 reais para perito criminal e delegado, o concurso traz em seu edital, segundo o entendimento do MPF, violações aos direitos dos candidatos que concorrem pelo sistema de cotas às pessoas com deficiência.
“Há enorme celeuma em relação à adaptação do concurso público aos portadores de necessidades especiais, e a compatibilidade dos candidatos selecionados de forma diferente com as funções exercidas na Polícia Federal”, diz o delegado de Polícia Civil do Paraná, Henrique Hoffmann, que é também coordenador da Pós-Graduação em Segurança Pública com Ênfase em Atividades Policiais do CERS.
No centro da controvérsia estão os itens 5.5, 7.4.9.12 e 22.5. O MPF pede que esses trechos sejam reformulados. Os itens 5.5 e 7.4.9.12 estabelecem que não haverá adaptação do exame de aptidão física, da prova oral, da prova prática de digitação, da avaliação médica, da avaliação psicológica (1ª etapa) ou do Curso de Formação Profissional às condições do candidato (2ª etapa).
O item 22.5 dispõe sobre a situação dos candidatos após a nomeação. Segundo o edital, o concurseiro aprovado e nomeado não poderá alegar impossibilidade de executar qualquer tarefa pertinente ao cargo ou impossibilidade de ser lotado em qualquer unidade da Polícia Federal.
Além da retificação do edital, o MPF pede a reabertura das inscrições, por prazo não menor do que cinco dias úteis, permitindo que candidatos possam concorrer às vagas destinadas às pessoas com deficiência, ou que candidatos já inscritos na ampla concorrência possam alterar suas inscrições para o sistema de cotas.
E agora, concurseiro?
Para que a retificação e a reabertura das inscrições sejam realizadas, é preciso esperar a decisão na Justiça. “É necessário aguardar se a Justiça Federal concederá a tutela provisória de urgência (liminar) e, ao final, a decisão de mérito (definitiva) nos termos dos pedidos do MPF”, explica Hoffmann.
Concurseiros, que desejam alterar a inscrição – seja para o sistema de cotas ou para concorrer às vagas destinadas às pessoas com deficiência – devem acompanhar a situação.
“Após as provas objetivas e discursivas, dentro do prazo a ser aberto, poderão solicitar atendimento especializado para realização das demais fases e etapas do certame, onde indicarão as adaptações de que necessitam”, diz Hoffmann.
Que direitos estão sendo desrespeitados, segundo o MPF?
O coordenador do CRS explica que, segundo o MPF, os direitos das pessoas com deficiência estão sendo violados. “Especialmente as diretrizes da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/15) e o Decreto 3.298/99”, afirma Hoffmann.
Em resumo, diz o especialista, o MPF entende que:
– Não basta a reservas de vagas, é necessária a adaptação das fases seguintes do concurso de acordo com eventuais limitações dos candidatos, devendo o edital prever a adaptação dos testes de aptidão física aos candidatos com deficiência, a depender do tipo e grau da deficiência;
– A análise da compatibilidade da deficiência dos candidatos com as atribuições do cargo deve ser feita não no concurso, mas durante o estágio probatório;
E qual o entendimento da Polícia Federal?
Segundo Hoffmann, o entendimento da PF, também resumidamente é o seguinte:
– Aos deficientes é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras;
– A pessoa com deficiência participará de concurso em igualdade de condições com os demais candidatos no que concerne ao conteúdo das provas, à avaliação e aos critérios de aprovação, ao horário e ao local de aplicação das provas, e à nota mínima exigida para todos os demais candidatos, devendo postular cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador. Isso porque os policiais estarão sujeitos a atuar em campo, durante atividades de investigação, podendo ser expostos a situações de conflito armado que demandam o pleno domínio dos sentidos e das funções motoras e intelectuais, no intuito de defender não só a sua vida, mas, também, a de seus parceiros e dos cidadãos.
Há jurisprudência para o tema?
Segundo Hoffmann, o tema já foi tratado pelo Supremo Tribunal Federal em decisão no Recurso Extraordinário 676.335 que estabelece:
– Não se pode presumir antecipadamente que nenhuma das atribuições inerentes aos cargos de natureza policial pode ser desempenhada por deficiente;
– Todavia, na avaliação concreta no concurso público, por critérios objetivos, o candidato deficiente pode ser reprovado na seleção pública, se detectada incapacidade para atividades policiais a serem desempenhadas, próprias do cargo. Fosse diferente, o interesse particular estaria se sobrepondo ao interesse público. O domínio dos sentidos, das funções motoras e intelectuais pelo candidato é fator obrigatório para o habilitar para o cumprimento das atribuições do cargo. O que se assegura ao portador de necessidade especial é a possibilidade de ter acesso aos cargos públicos, cujo desempenho não fique comprometido pela limitação do candidato. O que se busca é impedir a discriminação do portador de necessidade especial e a garantia de que, estando apto a desempenhar as funções inerentes ao cargo, não será vedado a ele o acesso.