Iniciativa cultiva horta em 3 mil metros quadrados de área e produz mais de 2 toneladas de alimentos por ano.
Em 2013, uma caixa de tomate chegou a ser vendida por R$ 150, na época, milhares de brasileiros optaram por cortar o alimento da mesa para não prejudicar o orçamento. Acostumado desde criança a plantar, Wagner Ramalho viu na crise alimentar a possibilidade de criar uma iniciativa para ajudar outras pessoas ensinando-as a cultivar seu próprio alimento, surgiu assim o “Prato Verde”.
O projeto transformou um terreno abandonado na zona Norte de São Paulo, com lixo e usado para o uso de drogas, em uma horta que chega a produzir duas toneladas de alimentos por ano.
“Eu acho injusto as pessoas, por não terem dinheiro, não se alimentarem do que elas querem. É tão fácil, é tão simples cultivar, eu não estou inventando a roda, na verdade, eu estou mostrando, relembrando as pessoas a produzir seu próprio alimento”, conta.
O local escolhido para sediar a iniciativa foi a Associação Mutirão, no Jardim Filhos da Terra, que Wagner frequenta desde os 11 anos. “Minha mãe me colocou aqui para fazer as aulas. Foi um momento bom, porque se não fosse isso talvez eu não seria essa pessoa que sou hoje”, conta ele.
Wagner sugeriu a ideia para Jailde Teixeira, gerente institucional da Associação Mutirão, e ela aceitou. “As famílias passaram a se interessar, querer conhecer, descobrir o que é um alimento orgânico, é muito interessante porque eles estão praticando em casa também, porque por menor que seja a casa da pessoa, sempre tem um cantinho que dá para plantar alguma coisinha”.
Mais de 2 toneladas de alimento são produzidas por mês. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Do lixo ao verde
Onde todos enxergavam lixo, Wagner viu uma nova realidade. Ele transformou um terreno abandonado onde moradores jogavam lixo e que era utilizado por usuários de drogas em mais de 3 mil metros quadrados de horta urbana, a qual produz 2 toneladas de alimento por ano.
“Tinha dias que tinha mais de 20 pessoas usando drogas aqui e era difícil porque já tinha crianças e a gente tinha um debate e depois que veio a horta com a insistência do administrativo, tudo mudou”, disse Wagner.
O projeto oferece educação ambiental para crianças, jovens e idosos da comunidade. Lá eles aprendem sobre a origem dos alimentos, a plantar, reutilizar a água da chuva, reciclar resíduos orgânicos, sobre o prejuízo do lixo para o meio ambiente, entre outras coisas. Há ainda algumas oficinas de culinária onde são ensinados pratos saudáveis feitos com produtos da horta.
“Eu não quero que ninguém vire engenheiro ambiental, gestor ambiental, eu quero que tenha consciência ambiental”, diz Wagner.
Wagner Ramalho, fundador do Projeto Prato Verde, oferece aulas de educação ambiental para crianças. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Origem
A consciência ambiental de Wagner foi despertada ainda na infância. Filho de pais separados, aos 6 anos, ele fugiu da casa onde morava com seu pai e morou nas ruas de Presidente Prudente, no interior de São Paulo. Sete meses depois seu pai o encontrou e pagou para que uma família indígena o criasse.
“A renda deles vinha do cultivo, então, era sopa de mandioca, sopa de batata-doce, era tudo da cultura de subsistência naquela casa, então, eu aprendi isso. Lembro que eles me deram um pedacinho de terra, simbólico e um pacotinho de alho, eu não saía daquele canteiro enquanto não nascesse. Quando eu vi o negócio crescendo e depois deu um monte, eu achei sensacional isso”, conta ele.
Já com 11 anos, a mãe de Wagner o trouxe para morar no Jaçanã, na Zona Norte de São Paulo. Mas a vida em uma grande cidade não fez com que ele esquecesse o contato com a terra. “Eu sou muito ligado com a natureza tudo está relacionado com o meio ambiente, eu reparo na atmosfera, no universo, isso me encanta, e está tudo conectado”, diz.
O projeto Prato Verde conta hoje com 3 mil metros quadrados de horta. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Frutos
Uma das pessoas ajudadas pelo projeto Prato Verde é Márcia Regina. Ela participa das atividades há 5 anos e graças ao seu envolvimento com a iniciativa ela conseguiu se sentir melhor depois de um quadro grave de depressão.
“Isso aqui abriu minha mente. Eu pensava que eu não podia fazer mais nada. Eu não me mexia, eu dependi muito da minha família para tudo, até para ir no banheiro, tudo era sempre eles que me ajudavam. Aqui eu comecei a cuidar da minha vida e a manter a minha casa. Eu vendo os alimentos aqui na comunidade mesmo. Eles gostam bastante”, disse Márcia.
Márcia Pena participa do Projeto Prato Verde há 5 anos. — Foto: Marcelo Brandt/G1
Outra moradora da região que usufrui do projeto Prato Verde é a engenheira florestal Bárbara Junqueira, ela disse que compra os produtos de Wagner e que ele possibilitou um acesso mais fácil ao mundo dos orgânicos.
“A primeira coisa que as pessoas falam é ‘orgânico é legal, mas é caro’ daí eu falo ‘não, não é tão caro assim, vem conhecer’. Aí a gente pede para o Wagner levar algumas coisas para esses grupos que a gente trabalha, grupo de amigos, e aí as pessoas acabam realmente consumindo. Elas falam ‘olha que bacana não sabia que era barato e que poderia ser tão perto de casa'”, conta Bárbara.
Bárbara Junqueira encontrou no projeto a possibilidade de consumir alimentos orgânicos mais baratos e perto de casa. — Foto: Marcelo Brandt/G1
A moradora faz parte do grupo de consumidores que compra cerca de 30% da produção do Projeto Prato Verde, o resto é doado para membros da comunidade e voluntários do projeto.
O agente de promoção ambiental, Júlio Colino, disse que parte dos alimentos são doados para pacientes de uma Unidade Básica de Saúde (UBS), os quais precisam de uma alimentação saudável, porém, não tem condições financeiras de arcar com o custo. “A gente tenta encontrar casos que unam a vulnerabilidade social e a deficiência nutricional”, diz Júlio.
O sonho de Wagner hoje é expandir o projeto e estimular o plantio nas lajes das casas para que mais pessoas possam cultivar e usufruir do cultivo.
G1