O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta terça-feira (25/11) o encerramento do processo que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a mais de 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
Com isso, terá início a execução da pena — o ministro determinou que o ex-presidente ficará na mesma sala especial onde já estava preso preventivamente desde sábado (22/11), na Superintendência da Polícia Federal em Brasília. O local tem uma cama de solteiro, televisão e ar-condicionado (veja vídeo).
A decisão de Moraes veio após a defesa não apresentar novos embargos de declaração — um tipo de recurso cujo o prazo se esgotou na segunda-feira (24/11).
Além disso, o ministro considerou que a defesa não poderia apresentar outro tipo de recurso, os chamados embargos infringentes. Isso porque o entendimento atual da Corte é que esse recurso só é cabível quando há ao menos dois votos absolvendo os réus — e, no caso de Bolsonaro, apenas o ministro Luiz Fux ficou contra sua condenação, no julgamento realizado na Primeira Turma do STF.
“Assim, sendo incabível qualquer outro recurso, inclusive os embargos infringentes, a Secretária Judiciária desta Suprema Corte certificou o trânsito em julgado do Acórdão condenatório em relação ao réu Jair Messias Bolsonaro”, decidiu Moraes.
A defesa do ex-presidente contestou a decisão, dizendo ser “surpreendente” a determinação da conclusão do processo antes dos embargos infringentes.
Os advogados afirmam que o regimento do STF não faz essa exigência de ao menos dois votos pela absolvição, embora isso esteja previsto na jurisprudência (conjunto de decisões que estabelecem precedentes para os casos seguintes) da Corte.
“Seja como for, a defesa ajuizará no curso do prazo estabelecido pelo regimento, o recurso que entende cabível”, diz a nota assinada pelos advogados Celso Vilardi, Paulo Bueno e Daniel Tesser.
A decisão de Moraes está sendo analisada pela Primeira Turma em sessão virtual, iniciada no início da noite desta terça-feira, com duração prevista de 24 horas. O próprio Moraes já deu seu voto, e foi acompanhado pelo ministro Flávio Dino. A expectativa é que os demais dois magistrados do colegiado confirmem o encerramento do processo.
A determinação para que Bolsonaro continue preso na Superintendência da PF ocorre em meio a críticas da família do ex-presidente e de seus apoiadores de que o ele poderia morrer na prisão, devido a problemas de saúde decorrentes da facada que sofreu na eleição de 2018.
“Já é um absurdo humanitário ele estar aqui na sede da PF [Policia Federal]. […] Isso aqui é uma crueldade. E é um risco muito grande à saúde dele, à vida dele”, disse nesta terça seu filho e senador, Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
Diante dessa preocupação, Moraes determinou “a manutenção de disponibilização de atendimento médico em tempo integral” a Bolsonaro, “em regime de plantão”.
O ministro também permitiu “o acesso da equipe médica que acompanha o tratamento de saúde do réu, independentemente de prévia autorização judicial”.
A decisão prevê ainda que Bolsonaro seja “submetido a exames médicos oficiais para o início da execução da pena, inclusive fazendo constar as observações clínicas indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário”.
Moraes determinou que a conclusão do processo seja comunicada à Presidência do Superior Tribunal Militar (STM) e à Procuradoria Geral do Ministério Público Militar para “decidir sobre a perda do posto e da patente” de Bolsonaro, que é capitão da reserva do Exército. Questionado pela BBC News Brasil, a assessoria do STM disse que o caso de Bolsonaro e outros réus em relação à patente só deve ser julgado no ano que vem.
Já o Tribunal Superior Eleitoral deve ser avisado para cumprir as consequências eleitorais da condenação — Bolsonaro ficará 35 anos inelegível. Segundo a legislação brasileira, a proibição de disputar eleições perdura por mais oito anos após o cumprimento da pena, que, no caso do ex-presidente, é de 27 anos e três meses de prisão.
A cela especial de Bolsonaro
Bolsonaro já está preso preventivamente em uma cela especial na Superintendência da Polícia Federal, em Brasília, desde sábado (22/11).
O local onde está, chamado sala de Estado-Maior, foi adaptado e é privativo. A cela é composta por banheiro reservado, cama, televisão, frigobar, ar-condicionado e uma mesa de trabalho.
O espaço é semelhante ao que abrigou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entre 2018 e 2019, em Curitiba (PR), quando esteve preso por condenação na Operação Lava Jato, posteriormente anulada pelo STF.
Moraes, inclusive, cita esse precedente ao determinar que Bolsonaro cumpra pena na Superintendência da PF.
Na decisão, o ministro estabelece ainda que “todas as visitas deverão ser previamente autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal, salvo os advogados regularmente constituídos nos autos e equipe médica”.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) é advogado e poderá ter acesso facilitado ao pai na prisão se for incluído em sua equipe de defesa.
Quando Lula esteve preso, isso foi feito com alguns integrantes do PT, como o atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que, na época, era candidato à presidência contra Bolsonaro e foi registrado como advogado do petista.
A defesa de Bolsonaro deve tentar reestabelecer a prisão domiciliar, com o argumento de que o ex-presidente tem graves problemas de saúde.
Esse cenário, porém, ficou mais difícil depois que Bolsonaro danificou sua tornozeleira eletrônicausando um ferro de solda, o que provocou sua transferência para a PF no sábado.
A prisão preventiva foi decretada em agosto por Moraes com o argumento de que havia risco do ex-presidente fugir do país.
Essa medida foi determinada dentro de inquérito que investigava a atuação do seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), nos Estados Unidos.
Ele articulou junto ao governo de Donald Trump retaliações ao Brasil para tentar impedir a condenação de Bolsonaro, mas não teve sucesso. Agora, Eduardo vai responder a um processo criminal por obstrução de justiça.
Moraes determinou também a execução da pena para outros seis condenados no processo. Os generais Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira ficarão presos no Comando Militar do Planalto, que fica em Brasília.
Outro condenado, o general Walter Braga Netto, está preso preventivamente desde dezembro de 2024 no Comando da 1ª Divisão de Exército, no Rio de Janeiro. Ele cumprirá a pena no mesmo local.
O ex-ministro da Justiça Anderson Torres, por sua vez, deverá ser preso no 19º Batalhão da Polícia Militar do Distrito Federal, que fica dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, e é conhecido como Papudinha. O local oferece condições melhores que a Papuda.
Já o ex-comandante da Marinha Almir Garnier ficará preso na Estação Rádio da Marinha em Brasília.
Outro condenado, o deputado Alexandre Ramagem, foi considerado foragido por Moraes. Ele deixou o Brasil para os Estados Unidos pouco antes da conclusão do processo.
“Considerando que o réu encontra-se foragido e fora do território nacional, determino a expedição do mandado de prisão e inserção no Banco Nacional do Monitoramento de Prisões (BNMP)”, diz a decisão.
CRÉDITO, REUTERS
CRÉDITO, REUTERS
Condenação inédita por golpe de Estado
Bolsonaro foi considerado pelo STF como líder de uma organização criminosa, com militares, policiais e aliados, que atuou para impedir a transição de poder após as eleições de 2022, vencidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ex-presidente foi declarado culpado de cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Além de Bolsonaro, os outros sete réus na ação penal também foram condenados: Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Foi a primeira vez na história do Brasil que um ex-presidente e generais foram condenados por tentativa de golpe de Estado.
Para o procurador-geral da República, Paulo Gonet, a organização criminosa agiu em várias frentes desde 2021 para tentar executar o plano de ruptura, desde discursos públicos para descreditar o sistema eleitoral até supostas pressões sobre o Alto Comando das Forças Armadas para apoiar um decreto de cunho golpista — a chamada “minuta do golpe”.
Gonet citou ainda na denúncia movimentos para tentar atrapalhar o andamento da eleição, citando os bloqueios da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia da eleição em 2022, em especial em regiões com eleitores favoráveis ao adversário Lula.
A PGR destacou ainda os ataques de 8 de janeiro de 2023 como o ato final da tentativa golpista.
Ao fim do julgamento, o STF considerou haver provas suficientes das acusações da PGR e condenou os réus.
BBC News







