A psicóloga Fernanda Navarro, de 49 anos (ao centro), e outras frequentadoras aguardam entrar no Remelexo do lado de fora, mostrando o comprovante de vacinação, além de usarem máscaras: ‘Já fizemos toda essa amizade aqui na fila, ninguém se conhecia’ — Foto: Fábio Tito/g1
Do lado de fora do Remelexo uma fila na calçada contornava a casa. Enquanto esperava entrar, a psicóloga Fernanda Navarro, 49, contou que, durante a pandemia, sentiu falta do forró, sertanejo e outros estilos para dançar.
“Eu fiquei praticamente depressiva, com crise de ansiedade… Me pegou bastante. Aqui no Remelexo é a primeira vez que venho. Estou muito feliz, já fizemos toda essa amizade aqui na fila, ninguém se conhecia. O forró faz isso, né”, afirmou Fernanda.
A psicóloga falou que se sentia segura para se divertir no lugar. “Já está todo mundo vacinado, aqui eles pedem até o comprovante, né. Mas de todos os lugares que já fui, só teve um que pediu o comprovante de vacina. Nenhum lugar está pedindo”, disse.
Do lado de dentro, ainda no começo da festa, o casal Fernando dos Santos, 40 anos, empresário, e Juliana Garrido, 36 anos, contabilista, lembrou que foi longo o período até poder voltar a dançar.
“Antes da pandemia passamos um tempo morando fora, e uma das coisas que fazia falta era o forró. Quando voltamos estávamos doidos pra vir aqui dançar, mas na mesma época começou a pandemia. Então tivemos que esperar mais esse tempão pra matar essa saudade”, disse Fernando.
“Eu acho que, com os protocolos de segurança, mostrando o comprovante de vacinação, já está tudo bem pra voltar, sim”, afirmou Juliana.
Maíra Pontin, de 31 anos, programadora, dança no Remelexo após a reabertura: ‘Esse forró é muito legal porque é de segunda-feira, só vem forrozeiro raiz’ — Foto: Fábio Tito/g1
“Eu vinha aqui dançar desde adolescente, ainda nem podia entrar mas dava um jeito. Esse forró é muito legal porque é de segunda-feira, só vem forrozeiro raiz. E essa volta casou certinho com a véspera de feriado, está muito bom”, contou entre uma dança e outra Maíra Pontin, de 31 anos, programadora.
O projeto que sobe no palco às segundas é o “Forró de Terno”, composto por músicos de quatro bandas diferentes. Eles não usaram máscaras para cantar e tocar os instrumentos porque a proteção os atrapalha durante o trabalho. Segundo os organizadores do show, os artistas também estavam vacinados e mantiveram o distanciamento de mais de um metro do público.
Músicas que tocaram no Remelexo Brasil comemoraram reabertura das casas de shows — Foto: Fábio Tito/g1
Ainda emocionados, eles comemoraram a reabertura das casas de shows e lembraram das dificuldades que estão passando durante pandemia.
“Todo o setor de entretenimento sofreu. A gente sobreviveu com algumas lives, que deram alguma sobrevida. Passei a dar mais aulas de cavaquinho também, presenciais e também online. E essa volta agora é uma celebração, mal dá pra acreditar”, contou Anderson Anjos, de 39 anos, tocador de cavaquinho da banda Balaio de Baião.
Foto mostra último show no Remelexo, em 13 de março de 2020 — Foto: Divulgação/Remelexo/Ricardo Galvão
“A gente chegou a fazer show com mesas, todo mundo sentado sem poder dançar, mas era outra energia. Fiz show em drive-in também, foram várias experiências diferentes. Eram as formas de estar próximo do público. E isso agora é uma honra, tem vários músicos que gostariam de estar aqui nesse momento da volta”, disse Nando Nogueira, de 29 anos, que tem carreira solo e toca acordeon.
“É estranho, a gente nunca imaginou passar tanto tempo sem o forró desse jeito. É difícil entender que vai voltar a ser mais ou menos como antes“, disse Thiago Fred, de 39 anos, que tem carreira solo cantando e tocando zabumba.
Frequentadores usam máscara para dançar no Canto da Ema — Foto: Reprodução/Instagram Canto da Ema
O g1 também entrou em contato com o Canto da Ema para tentar falar com os donos e poder acompanhar a reabertura da casa, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
Na sua página oficial, o Canto mostrou fotos e vídeos com frequentadores, a maioria, dançando com máscaras. Num vídeo postado pelo músico Mestrinho em sua rede social aparece um homem com a máscara abaixada, sem tampar o nariz e a boca, presa ao pescoço, enquanto ele assiste ao show. Apesar disso, foram poucas as pessoas que usaram máscaras de maneira incorreta na casa.
Vídeo postado na página do músico Mestrinho mostra um frequentador (à esquerda da imagem) com a máscara abaixada presa ao pescoço. Apesar disso foi pequeno o número de pessoas que não usaram a proteção no Canto da Ema. A maioria do público usou máscaras na casa — Foto: Reprodução/Instagram Mestrinho
Em vídeos divulgados antes da reabertura, um dos donos reforçava ao público a necessidade de usar a proteção para dançar também, além de exigir o comprovante de vacinação.
Como no Remelexo, os músicos que estiveram no Canto da Ema também não usaram máscara para cantar, mas mantiveram o distanciamento do público.
Canto da Ema comemorou a reabertura da casa que ficou fechada durante a pandemia — Foto: Reprodução/Instagram Canto da Ema
Segundo Eduardo Aranibar, subsecretário de Competividade Industrial, Comércio e Serviços do Estado de São Paulo, a decisão do governo de determinar a reabertura das casas de espetáculos se baseia nos indicadores da Secretaria de Estado da Saúde contra a doença.
“Considerando as quedas em casos [de Covid], indicadores e mais de 86% da população adulta vacinada permitiu a volta gradativa. Dia 1º de novembro é o momento com 100% da capacidade de cada estabelecimento. Isso vai se aplicar a shows com público em pé”, disse o subsecretário ao g1.
Ele, no entanto alertou sobre as exigências em alguns locais. “Uma casa de forró tem mais contato físico, usando mascará e comprovante de vacinação será permitido a presença de público“, falou Eduardo. “Vai ter locais com concentração de pessoas, mas serão locais com pessoas vacinadas ou testes negativos para Covid. A expectativa é de que essa reabertura desses locais não cause impacto nos casos de contaminação [pela doença] nos hospitais.”
O que diz um especialista
Mestrinho e banda reabriram o Canto da Ema; somente os músicos não usaram máscaras porque a proteção os atrapalha para cantar. — Foto: Reprodução/Instagram Canto da Ema
Renato Kfouri, pediatra e infectologista, presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria e mestre pela Unifesp, afirmou à reportagem que o simples gesto de alguém que sai de sua casa já coloca essa pessoa em risco de se contrair a Covid. Mas que atualmente está menor.
“Tudo o que você for fazer, sair de casa, envolve algum grau de risco. E claro que todos esses pilares são manejados de acordo com a quantidade de vírus que circula na comunidade. É o que a gente chama de taxa de transmissão. Quando você tem registro de 10 mil casos e 400 mortes, como a gente está hoje, a chance de você topar com o vírus pela frente é muito menor”, disse Kfouri.
Mas esses riscos aumentam dependendo do ambiente e das medidas de segurança que as pessoas usem ou deixem de usar.
“Os riscos maiores são de acordo com as vias de transmissão do vírus. Se você está em ambiente fechado, com proximidade, sem máscara, sem vacinação, o seu risco é muito alto. Se você está em ambientes abertos, de máscara, com distanciamento, e com vacina, o risco é menor. Então são esses os pilares que modulam o risco maior ou risco menor”, falou o infectologista.
De acordo com Kfouri, toda retomada das atividades tem de ser feita com cautela até para evitar um retrocesso. “Então hoje dentro do cenário epidemiológico que a gente vive a gente sempre tem buscado a flexibilização com um olhar no número de casos. Isso pode ser retrocedido de alguma maneira ou não.”
G1