Para quem sobrou no ramo, o medo é um “efeito dominó”. No Shalimar, com 61 quartos, apenas quatro costumam ser ocupados durante o dia desde a interdição. No horário considerado de maior movimento, entre 23h e 5h, têm sido registradas entre 15 e 20 entradas, menos da metade da capacidade do estabelecimento.
Alfredo Lopes, presidente do Sindicato dos Meios de Hospedagem do Município do Rio de Janeiro, calcula que todos os estabelecimentos da Avenida Niemeyer perderam, juntos, 60% do movimento. Ele acredita que o fechamento da região representa uma enorme perda para o turismo, pois é um dos pontos que mais chama a atenção de turistas que visitam a cidade.
“Ali é um patrimônio do Rio, uma estrada panorâmica que liga dois bairros importantes. A gente quer uma solução”, explicou Lopes.
Ele destacou que os sucessivos problemas na avenida geram insegurança nos frequentadores. “Os estabelecimentos começaram a ter prejuízo pois as pessoas começaram a ficar inseguras e também pelas condições de conservação das encostas”, detalhou.
Área de lazer: crianças brincam na Avenida Niemeyer, interditada para o trânsito, em plena quinta-feira — Foto: Marcos Serra Lima/G1
Márcia Malheiro, gerente do Nosso Hotel, trabalha na Avenida Niemeyer há 18 anos e afirma que nunca viu uma crise dessas proporções. Ela reclama das interdições e dos letreiros, que indicam que a via está completamente fechada e não é possível chegar ao local. A gerente também destaca que é possível chegar até os hotéis de carro.
“Eu acredito que a gente não consiga ficar mais um mês fechado, com a pista fechada. São muitos encargos que nós temos. São impostos que nós pagamos, a folha de pagamento, luz, água”, explicou Márcia.
Quem trabalha no setor espera um acordo entre a Prefeitura do Rio e o Ministério Público.
“A gente espera que as autoridades se manifestem e a gente possa dialogar da melhor maneira possível. São empresas que estão aqui há quarenta anos”, destacou Antônio, dono do Shalimar, inaugurado em 1975 e que conta com 60 funcionários.
Ao lado, o Nosso Hotel, que tem mais de 40 anos desde a fundação, emprega outros 30 trabalhadores.
Motéis da Avenida Niemeyer tentam atrair clientes com promoções — Foto: Marcos Serra Lima/G1
Dia dos Namorados 50% pior
A data mais importante para o setor, o Dia dos Namorados, no último dia 12 de junho, estava no meio dos problemas causados pela interdição. A frequência caiu à metade em relação ao ano passado – em 2018, os estabelecimentos já enfrentavam problemas com as sucessivas interdições da via.
Promoções em redes sociais não deram conta das perdas na data. O cenário de quartos vazios e estacionamentos sem carros dos estabelecimentos não assusta somente quem é dono ou tem cargos de gerência. Quem trabalha na manutenção e atendimento também teme perder o emprego.
Maria Rosa, de 54 anos, que trabalha há 18 anos no Shalimar, é moradora da comunidade do Vidigal e teme ficar desempregada. Ela conta que chegou a registrar mais de 80 entradas no estabelecimento em um fim de semana, marca muito longínqua do atual cenário.
“O Dia dos Namorados foi fraco. Antes faziam filas esperando arrumar suíte. Esse ano, ficaram as suítes vazias esperando os clientes aparecerem. Foi muito triste”, contou a funcionária.
O medo é engrossar a fila do desemprego. Por falta de movimento, o Shalimar já teve que dispensar funcionários. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Estado do Rio de Janeiro tem 1,358 milhão de pessoas sem trabalho.
“Eu tenho medo de perder o meu emprego. Não só eu, como todos os meus colegas de trabalho. Porque não está fácil”, destacou.
Segundo um levantamento do sindicato que representa a categoria, os hotéis e motéis da Avenida Niemeyer davam emprego para 608 pessoas no antes do fechamento. Pelo menos 60 dessas vagas foram fechadas, com o fim das atividades do Motel Vip’s.
Placa informa fechamento da Av. Niemeyer por causa de decisão judicial — Foto: Marcos Serra Lima/ G1
Segundo quem vive da circulação na Av. Niemeyer, a vida não está fácil há muito tempo. A via passou por uma série de interdições para obras e para a circulação de material de construção, principalmente no horário de maior demanda dos quartos, à noite e durante a madrugada.
“Isso já começou em 2014, com as obras de preparação e construção para as Olimpíadas. Aqui, no caso, tivemos asfaltamento, iluminação. A construção dos dois elevados do Joá, as duas pistas novas. A construção da ciclovia. Isso tudo implicou em interdições sucessivas”, destacou o empresário Antônio Cerqueira.
Fechamento da Av. Niemeyer
Deslizamento de terra na Avenida Niemeyer em 16 de maio — Foto: Reprodução / TV Globo
A Avenida Niemeyer foi fechada no dia 28 de maio nos dois sentidos a pedido do Ministério Público Estadual, que indicou haver risco de deslizamento de terra e de rochas. A via chegou a passar por uma nova vistoria, mas a decisão de manter o local fechado foi mantida.
Por dia, em média, quando está aberta, a avenida recebe 36 mil veículos, de acordo com dados do Centro de Operações da Prefeitura do Rio divulgados na época do fechamento.
No dia 7 de fevereiro, uma forte chuva atingiu a Avenida Niemeyer, causando o desabamento de mais um trecho da Ciclovia Tim Maia. Pelo menos quatro pontos de deslizamento bloquearam a via. Dois ônibus foram atingidos pelos deslizamentos de terra, e duas pessoas morreram.
No dia 16 de maio, a Avenida Niemeyer foi fechada por outro deslizamento de terra. Uma casa foi atingida, mas não houve vítimas.
Estudante anda de bicicleta na Avenida Niemeyer, interditada para o trânsito, na tarde desta quinta-feira (27) — Foto: Marcos Serra Lima/G1
Questionada pelo G1 se há alguma previsão de liberação da Avenida Niemeyer, a Secretaria Municipal de Infrestrutura e Habitação e a Geo-Rio informou que todas as ações consideradas necessárias para a reabertura da via, de acordo com o laudo feito pelos peritos judiciais, já foram realizadas.
A Prefeitura do Rio destacou ainda que todas as medidas de redução de risco, como o fechamento em caso de acúmulo de chuva de mais de 10 mm em uma hora, já são suficientes para garantir a segurança. E que 54 intervenções estão sendo realizadas no local, como demolição de casas e obras na rede de esgoto.
Estas ações têm previsão de término em novembro e custo superior à R$ 31 milhões e incluem colocação de drenos profundos, desmonte de blocos de rocha, restabelecimento do sistema de drenagem e limpeza da região.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro foi procurado, mas não se manifestou até o fechamento desta reportagem.