MPT afirma que o casal liderou, durante anos, um sistema estruturado e lucrativo de captação.
O Ministério Público do Trabalho na Paraíba (MPT-PB) ajuizou uma ação civil pública em que pede mais de R$ 12 milhões por dano moral coletivo e indenizações individuais que variam de R$ 2 milhões a R$ 5 milhões às vítimas de um suposto esquema de tráfico de pessoas, exploração sexual e trabalho análogo ao de escravo, que teria sido comandado pelo influenciador digital Hytalo Santos e pelo marido dele, Israel Nata Vicente, conhecido como Euro.
A ação é baseada em “robustos elementos de prova” reunidos em inquérito, segundo o Grupo de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador (Geaf). O MPT afirma que o casal liderou, durante anos, um sistema estruturado e lucrativo de captação, controle e exploração de dezenas de crianças e adolescentes, com apoio de diversos outros agentes, incluindo pessoas físicas e jurídicas.
Tráfico de pessoas e aliciamento em Cajazeiras
De acordo com o MPT, o esquema começava com o aliciamento de crianças e adolescentes vulneráveis, principalmente no município de Cajazeiras (PB). Os menores eram levados para morar com o casal em João Pessoa, em um “arranjo familiar” considerado totalmente ilegal. Para convencer as famílias, que eram pobres e com baixa instrução, os réus ofereciam promessa de fama, melhoria financeira e apoio com despesas básicas, além de ajuda mensal fixa.
O órgão afirma que os pais autorizaram que os filhos fossem entregues a terceiros e se afastassem radicalmente do convívio familiar, permitindo que morassem a centenas de quilômetros de casa.
Exploração sexual on-line e offline
A investigação identificou práticas contínuas de exploração sexual das crianças e adolescentes, tanto nas redes sociais quanto fora delas. As chamadas “crias do HS” eram exibidas em fotos e vídeos sexualizados, seminuas e em coreografias provocativas, sempre em publicações monetizadas.
Segundo o MPT, elas também acompanhavam o casal em viagens e festas, inclusive em locais ligados ao crime organizado, onde eram “ostentadas como troféus” e até “oferecidas como prêmio” em trocas de favores ou articulações comerciais.
Para intensificar o apelo sexual das vítimas, algumas foram submetidas a sucessivos procedimentos estéticos ainda na adolescência.
Trabalho em condições análogas à escravidão
Alguns relatos de testemunhas (entre elas ex-assessores e policiais militares que atuaram na segurança do casal) descrevem bastidores de intensa violação de direitos.
O conjunto das práticas, segundo o MPT, configura trabalho em condições análogas à de escravo, nos parâmetros modernos definidos pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, além de cárcere privado.
As vítimas eram submetidas a:
- isolamento total da família;
- confisco de celulares e meios de comunicação;
- cerceamento da liberdade de ir e vir;
- controle rígido da rotina;
- jornadas exaustivas de gravação, com privação de sono;
- ausência de remuneração e autonomia financeira;
- coação psicológica constante;
- interferências na identidade de gênero e orientação sexual.
O que o MPT pede à Justiça?
- cessação definitiva das violações e garantia de que não se repitam;
- mais de R$ 12 milhões em dano moral coletivo;
- indenizações individuais de R$ 2 a R$ 5 milhões;
- acompanhamento médico, psicológico, social e proteção institucional às vítimas.
Para os menores de idade, o órgão solicita que o dinheiro seja depositado em poupança judicial até os 18 anos, com liberação antecipada apenas mediante autorização judicial e para necessidades essenciais.
Os pais serão responsabilizados?
O MPT afirma que pais e mães também contribuíram para a violação ao permitirem o afastamento dos filhos, a ruptura do convívio familiar e a falta de acompanhamento escolar e de saúde. Apesar disso, o órgão decidiu não responsabilizar financeiramente os genitores, considerando a vulnerabilidade econômica das famílias.
Ainda assim, pede que a Justiça imponha medidas obrigatórias, como a proibição de permitir que os filhos menores participem de conteúdos digitais de conotação sexual ou de atividades consideradas como piores formas de trabalho infantil.
Consentimento das vítimas é juridicamente irrelevante
Segundo o MPT, o consentimento das vítimas ou de seus responsáveis não tem validade jurídica, porque os adolescentes viveram anos sob manipulação psicológica, dependência financeira e controle emocional, situação que pode se aproximar da chamada Síndrome de Estocolmo.



